O Fogo da Paixão e a Constância do Amor

Jun 5, 2022    Mariana Merotto

Introdução
Hoje quero falar sobre um verso que tem falado ao meu coração há alguns meses. Eu chequei meu caderno devocional, e a primeira vez que esse verso está anotado lá é em março desse ano. Coincidentemente, temos cantado músicas com esse tema nas nossas últimas reuniões. Aliás, não é uma coincidência, acredito que há um convite do Senhor para que aquilo que queima nesses versos, queime também em nós.

"Coloque-me como selo sobre seu coração, como selo sobre seu braço. Pois o amor é forte como a morte, e a ciúme, exigente como a sepultura. O amor arde como fogo, como as labaredas mais intensas.”
Cânticos 8:6

Apesar de Cânticos ser um livro que trata de um poema de amor entre Salomão e a Sulamita,
existe um significado profético profundo nele, o do amor de Cristo e sua Igreja e consequentemente entre Cristo e nós. Olhando por esse prisma, creio que esse verso tem tudo a ver com aquilo que temos falado aqui constantemente como sendo o chamado principal da Base: zelar pela presença de Deus.

1 – Como Zelar pela presença de Deus

A palavra ali traduzida como “ciúme” poderia ser entendida também como paixão e zelo. Nós como comunidade temos diante de nós essa tarefa de zelar pela presença de Deus. Essa foi a incumbência no dada por Deus, é por ela que devemos lutar, orar, cantar e nos esforçar.

Da forma como eu vejo, podemos zelar pela presença de Deus enraizados em duas coisas distintas: a religiosidade ou o amor. A religiosidade é como os fariseus zelavam pela presença de Deus. Eles estavam atentos ao cumprimento de todas as regras, presos a todos os rituais, cientes das orações polidas e das palavras corretas. Mas o seu desejo único de seguir os protocolos, esfriou seus corações e os fez não perceber o Deus encarnado. Não estou dizendo que devemos viver nossas vidas de qualquer forma, sem temor e reverência a Deus, mas que certamente é possível seguir todas as regras e ainda assim não perceber sua real presença.

Creio que Deus nos chamou para zelar pela sua presença a partir de algo mais profundo do que uma lista de regras. Ele nos chamou para zelar, cuidar, proteger, sermos diligentes com a presença a partir do amor.

“Seis dias antes de começar a Páscoa, Jesus chegou a Betânia, onde morava Lázaro, o homem que ele havia ressuscitado dos mortos. Prepararam um jantar em homenagem a Jesus; Marta servia, e Lázaro estava à mesa com ele. Então Maria pegou um frasco de perfume caro feito de essência de óleo aromático, ungiu com ele os pés de Jesus e os enxugou com os cabelos. A casa se encheu com a fragrância do perfume. Mas Judas Iscariotes, o discípulo que em breve trairia Jesus, disse:Este perfume valia trezentas moedas de prata. Deveria ter sido vendido, e o dinheiro, dado aos pobres". Não que ele se importasse com os pobres; na verdade, era ladrão e, como responsável pelo dinheiro dos discípulos, muitas vezes roubava uma parte para si. Jesus respondeu: "Deixe-a em paz. Ela fez isto como preparação para meu sepultamento.” João 12:1-7

Maria aqui, cuidou da presença de Jesus, não se atentando para os procedimentos corretos, mas a partir do amor que leva a entrega total. O coração de Maria não pode se conter diante da presença do Mestre, e ela decidiu dar a Ele o seu melhor e assim mostrar honra e cuidado por Ele. O amor nos leva aonde um conjunto de procedimentos não pode nos levar. Se agimos a partir de uma lista de obrigações, somos conduzidos a obediência de comandos limitados, mas o amor rasga com todos os limites e entrega até o fim, sem medir as consequências e sem reter nada.

2 – O amor maduro e a paixão avassaladora

Agora, o problema em nossa cultura é que não temos mais uma definição palpável do que é o amor. Somos regidos, em grande parte apenas pelas paixões que instigam os sentidos, mas que duram pouco. A ciência nos diz que a paixão é um sentimento fulminante, que dura em média dois anos. A paixão nos empolga, nos faz agir de maneira irracional. A paixão é uma espécie de amor que arde.

A paixão não é necessariamente ruim, e nós vamos voltar a ela em alguns instantes. Mas, mais do que experimentar um mix de sentimentos, somos convidados a viver em amor fiel por Jesus. O amor é, em essência diferente da paixão. Ele está firmado em uma decisão e é em si, duradouro. Nós temos um exemplo disso na Bíblia, vamos ler João 6: 66-69

“Nesse momento, muitos de seus discípulos se afastaram dele e o abandonaram. Então Jesus se voltou para os Doze e perguntou: "Vocês também vão embora?. Simão Pedro respondeu: "Senhor, para quem iremos? O senhor tem as palavras da vida eterna. Nós cremos e sabemos que o senhor é o Santo de Deus". João 6: 66-69
Pedro aqui, tomado de paixão, diz essas palavras inspiradoras. E elas tem também reverberado em meu coração. Essas palavras de Pedro não foram ruins, muito pelo contrário! Ele aqui nos ensina uma lição valiosa sobre viver uma vida sem outra opção. Devemos ser profundamente confrontados e marcados pela atitude de Pedro aqui. Esse é o tipo de resposta que devemos ter, o tipo de vida que devemos almejar, uma vida disposta a seguir Jesus, porque sabe que sem ele não há nada de valioso nesse mundo.

Mas, embora tenha dito essas palavras com aparente convicção, nós sabemos que Pedro nega a Cristo. Sabe, embora eu ame as expressões extravagantes que temos muitas vezes no culto, elas sozinhas estão aquém daquilo que Deus espera de nós. Mais do que momentos assim, quero viver uma jornada assim, de um amor ardente, que queima continuamente.

Pedro alcançou isso depois de ser restaurado por Jesus. A paixão de Pedro se uniu ao amor maduro, e depois de seu último encontro com Jesus ele se tornou o homem que viveu apaixonadamente por Cristo até a morte. Creio que esse seja o convite de Deus para nós. Viver um amor maduro, profundo, incendiado de paixão e disposto a entregar tudo.

3 – Selados pelo Espírito

Mas a pergunta que eu me faço é: como Jesus? Eu quero viver esse amor, mais do que isso tenho sentido um impulso do Espírito para ser assim, mas olhando para mim é impossível. Meus sentimentos são oscilantes, minha disposição muitas vezes passageira.

O que eu tenho aprendido é que é preciso não só jorrar desse amor, mas viver conectada a fonte real do amor. A Bíblia nos diz que amamos a Deus porque Ele nos amou primeiro, e que o próprio Deus é amor. Ele não sente amor, Ele é amor.

Em 1 João 4, a partir do verso 19 veremos o autor fazer um paralelo direto entre permanecermos em

Deus, termos recebido seu amor, Ele permanecendo em nós e nossa capacidade de amar. Essa não é a primeira vez que João escreve sobre isso. Ao relatar as palavras de Jesus em João 15, o apóstolo registra aquilo que ouviu: Jesus nos amou e nós precisamos permanecer nesse amor. E em sua oração final em João 17:26, Jesus mais uma vez nos garante que o amor do Pai que estava nele, estaria sobre nós, e assim ele mesmo (Jesus) estaria em nós.

Para nós é impossível amar desta maneira, mas a palavra nos garante que contemplar Deus nos transforma de glória em glória.


“Agora vocês também ouviram a verdade, as boas-novas da salvação. E, quando creram em Cristo, ele colocou sobre vocês o selo do Espírito Santo que havia prometido. O Espírito é a garantia de nossa herança, até o dia em que Deus nos resgatará como sua propriedade, para o louvor de sua glória” Efésios 1:13-14

Em outras passagens, a Palavra nos afirma que o selo do Espírito é não só a garantia de nosso pertencimento a Cristo agora, mas a garantia de redenção eterna. A certeza do amor de Deus, do pertencimento ao Pai, a meditação em sua misericórdia, o experimentar de sua graça, todas essas experiências que são vividas na presença de Deus, no permanecer em seu amor e na prática de experimentar a comunhão com o Espírito é o que gera em nós o tipo de coração que é ardente como a paixão e constante como o amor.

Oração não tem a ver com fim dos tempos apenas porque desejamos apressar a sua vinda, mas porque contemplar, adorar e nos derramarmos em Deus é o que gera o tipo de amor necessário para enfrentarmos o porvir.

Cultivar a presença é o que nos faz queimar de amor por Deus, e ter um coração com desejos completamente voltados a Jesus é o que nos provê a base sólida para que permaneçamos zelando por sua presença.

Conclusão

Embora o mundo nos diga que primeiro vem a paixão e ao fim dela, se tivermos sorte, estaremos tomados por amor, a Sulamita nos mostra que não só é possível, mas desejável que tenhamos ambos em nosso relacionamento com o amado.

Ela usa tanto o amor, como a paixão para descrever seu sentimento pelo noivo. Um amor que é forte como morte, ou seja, que resiste as mais duras provações, que se estende até o último suspiro, que permanece fiel por toda a vida. E uma paixão mais cruel (que aqui poderia ser traduzido como forte) que a sepultura. Um tipo de paixão que não se abala, que não deixa escolhas e que entrega tudo. Ela termina dizendo que esse amor arde como fogo, como labaredas intensas.

Mas todos nós, com rosto sem véu, contemplando como em espelho a glória do Senhor, somos transformados na mesma imagem de glória em glória, como pelo Senhor o Espírito.”
2 Coríntios 3:18

Note que a Sulamita pede que seu amado a coloque como selo em seu coração, ela deseja que saibam que eles pertencem um ao outro. Em uma expressão de amor ardente e eterno, ela deseja que o selo marque uma união profunda e indissolúvel. Esse é o tipo de amor não pode ser gerado em nós espontaneamente, mas nasce primeiro do selo que recebemos de Deus.

O selo do Espírito nos garante a capacidade sobrenatural de andar amando apaixonadamente o Senhor. Temos em nós, por causa do Espírito de Deus o necessário para corresponder ao amor ardente de Jesus e assim viver o tipo de amor que carregamos até o túmulo e experimentamos plenamente depois de nos deitarmos nele.
Esse é o anseio de Deus para nós hoje, que seu Espírito gere em nós chamas perpétuas de amor apaixonado, abnegado, completamente entregue.